sexta-feira, 19 de julho de 2019

sobre.

Quando eu era criança, queria ser professora. Sentava na pequena área de serviço de um antigo apartamento, onde minha lousa e os gizes que minha mãe comprava, ficavam guardados na lateral da máquina de lavar roupas. Era ali que eu imaginava uma turma de poucos alunos, todos sentados em carteiras alinhadas atrás de mim, enquanto escrevia a matéria no pequeno quadro negro e ditava cada sílaba, esperando que eles copiassem todo o conteúdo. E então eu me sentia gigante. Era como se eu pudesse ser o que quisesse. Me sentia um pássaro com asas grandes, sobrevoando o mundo. Livre.
O desejo de ser professora durou até minha adolescência. Nessa fase deixe de saber ao certo o que queria de fato ser. A real é que ser adolescente é um porre. A gente quer ser tudo e nada. Eu jogava vôlei e fazia isso muito bem. Eu era realmente boa em algo, saca? Em paralelo, me paravam constantemente nas ruas e transportes públicos, entregando cartões de agências de modelo, implorando para que eu fizesse um teste e iniciasse a carreira. E eu simplesmente repudiava. Não queria holofotes, não queria deixar de comer as besteiras que adolescentes amam e não queria passar minhas tardes vestindo roupas, tirando fotos e andando em passarelas. Da mesma forma que,  mesmo sendo muito boa no vôlei, não sabia se queria ser destaque nos clubes e federações.
Era isso, eu simplesmente não queria ser destaque em nada.
E então decidi que seria jornalista. Ficar escondida detrás de folhas de papel era exatamente o que precisava. Saber escrever eu sempre soube. Tive histórias divulgadas em edições de livros escolares desde criança. Eu sabia mesmo colocar meus sentimentos numa folha sulfite. Vomitava quem eu era - ou achava ser. Era isso! Jornalista.
Mas, no final do ensino médio alguma coisa mudou. Por mais que eu soubesse que ser jornalista era algo importante, alguma coisa faltava. Então fui pedir socorro para pessoas próximas, as quais sugeriram que eu procurasse alguma profissão que ajudasse pessoas: seja médica! Seja fisioterapeuta! ... Seja psicóloga!
Psicologia?
E lá fui eu. Ainda sem saber de verdade quem eu era e o que queria, mergulhei de cabeça, o mais fundo que eu podia, nessa profissão maluca e tão desgastante. E foram cinco anos (de curso) permeados por angústias, questionamentos, autoconhecimento, frustrações e noção de mundo.
Hoje são dez. Sem saber exatamente quem sou, mas com a certeza do que quero. Foi um resgate de uma infância já diferente, de uma necessidade sutil de ajudar pessoas. Seja em sala de aula, seja trazendo verdade pro mundo, seja num voluntariado em uma creche com apenas 12 anos de idade (quem raios decide ser voluntário em creche aos 12 anos de idade?!).
Ser psicóloga me destrói e me reconstrói todos os dias.
Ser psicóloga social me faz querer abraçar o mundo e dizer que tudo vai ficar bem, mesmo sabendo que não vai.
Mas, principalmente, ser o que eu sou, profissional e pessoalmente (essas duas dificilmente separadas), me faz entender que, apesar de não saber completamente QUEM sou - se é que um dia saberei - tenho a certeza de saber que sempre vou pro lado dos que necessitam; daqueles que lutam pela sobrevivência; daqueles que precisam, mesmo sem saberem, de um abraço forte e de alma entregue,  de uma escuta e um olhar.
É saber que sempre estarei na frente dessa gente que luta, pra dizer: eu te enxergo.


Obrigada vida, por toda essa trajetória.